Futebol&Mulher também é cultura: A invasão estrangeira no Brasil e o Athletic Bilbao

Não é que jogador estrangeiro fazendo sucesso no Brasil seja novidade, mas é inegável que o fenômeno da sulamericanização do futebol brasileiro ganhou força nos últimos anos. Típico exportador de talentos e produtor em massa de jogadores, o futebol nacional começou a sofrer com a emergência de turcos, árabes, russos, cazaques e semelhantes, todos com ligas pouco atraentes, mas muito dinheiro no bolso. A competição ficou desigual. Já não se tratava mais somente de grandes clubes europeus levando embora nossos maiores talentos - de repente, qualquer clube meia-tigela proveniente de um fim de mundo aleatório chegava aqui e carregava embora nossos talentos mais-ou-menos (mais pra mais ou mais pra menos passou a não fazer diferença). Tentando equilibrar a situação, e ganhar de volta um certo prestígio capaz de tornar o mercado interno mais atraente do que os petro-mafio-dólares, o Brasil, que nunca foi muito, de maneira geral, de crescer o olho para terras hermanas (orgulhoso que é) passou a aproveitar sua condição de potência econômica e vitrine mundial para ir buscar nos países sul-americanos a solução para o seu drama.

O resultado disso é que quase todos os grandes clubes brasileiros possuem, hoje, pelo menos um jogador estrangeiro, em sua maioria sul-americanos. Se Carlito Tévez como Craque do Brasileirão em 2005 foi doído em muita gente ('mas poxa vida, um argentino?'), apenas cinco anos depois a ideia já está muito bem assimilada, não soa mais como absurda e ofensiva, não fere mais o orgulho tupiniquim. A ponto de, em 2010, os três grandes candidatos a craque da competição serem argentinos (Montillo, do Cruzeiro, Conca, do Fluminense, e, correndo por fora, o não menos talentoso D'Alessandro, do Internacional). Quem imaginaria, há alguns anos atrás, o dia em que o Brasil veria hermanos dominando, com sobra, meio-de-campos pelo país a fora? Há anos clubes como Boca Juniors, River Plate e América do México, entre outros gigantes sul-americanos, vasculham todo o continente em busca de talentos. Seus times são grandes misturebas latinas, jogadores que, desde muito novos, transitam entre países como se não estivessem cruzando fronteiras. A do Brasil sempre foi aquela mais difícil de ser vencida, a que se impunha como um obstáculo a ser batido. Pois não mais. O custo-benefício desses jogadores, que geralmente são mais baratos em todos os sentidos do que a maioria dos brasileiros, provou-se vantajoso e o Brasil, enfim, desfruta da sua posição privilegiada diante do restante da América Latina (com exceção provavelmente do México, que, se não tem um campeonato tão disputado e qualificado quanto o brasileiro, ainda oferece os maiores salários) também no mercado do futebol.

Esta pseudo-invasão estrangeira é ainda um fenômeno mínimo se compararmos ao que acontece há décadas na Europa. A Internazionale de Milão, campeã da Champions League na última temporada, foi a campo sem um único italiano no time (pra não dizer que não entrou ninguém, Marco Matterazzi participou dos minutos finais e distribuiu algumas bordoadas, só pra não perder o costume). Casos assim são extremamente comuns e, por mais que a UEFA demonstre uma certa preocupação com o possível enfraquecimento do futebol europeu devido ao elevado número de estrangeiros nas ligas, nada de muito significativo é feito além de cotas marotas e facilmente contornadas aqui e ali. Isto ganha projeção também na formação das seleções nacionais, que cada vez vê o número de jogadores naturalizados aumentar. Os brasileiros, naturalmente, são campeões nas naturalizações.

O que não é tão comum assim são os clubes que, nadando contra a correnteza, escolhem preservar suas raízes nativas, aceitando somente jogadores locais, custe o que custar. Que se tenha conhecimento, existem apenas três clubes nestas condições no mundo, com regras que proíbem a contratação de qualquer atleta estrangeiro. O Saprissa, da Costa Rica, e o Chivas Guadalajara, do México, são dois deles. Mas o caso mais interessante talvez seja o do Athletic Bilbao, terceiro clube mais vitorioso da Espanha, que há anos não sabe o que é conquistar um título expressivo e vive entra a zona de rebaixamento e uma modesta vaguinha na Copa da UEFA, mas não abandona sua ideologia.

Maior clube do País Basco, o Bilbao não aceita em seu elenco jogadores que não sejam originários da região. Inicialmente, somente atletas nascidos nos arredores poderiam se juntar ao clube, mas, como a situação foi ficando cada vez mais complicada, o Athletic abriu exceções para pessoas com ascendência basca, mesmo que nascidos em outros países ou regiões da Espanha. Caso, por exemplo, do francês Bixente Lizarazu, nascido na parte francesa do País Basco.

Curiosamente, o Athletic foi fundado por imigrantes britânicos. Entretanto, devido a reclamações dos rivais, o clube passou a empregar a regra dos bascos. Seu grande rival, o Real Sociedad de San Sebastián, aboliu sua exclusividade basca em 1989 ao contratar o irlandês John Aldridge, ídolo do Liverpool, que mais tarde se tornaria também treinador do clube basco.

Durante a ditadura franquista, que oprimia as diversas culturas existentes dentro do território espanhol em prol de uma cultura nacional, unificada, baseada em Madrid, o Athletic tornou-se um ícone da resistência basca. Sua política de jogadores firmou-se como um símbolo de aliança inabalável às crenças do povo basco e aos seus costumes, bem como à luta separatista. O estádio do clube era um dos poucos lugares onde a língua local, Euskara, proibida durante a ditadura, podia ser abertamente utilizada. Tudo isto só fez crescer o orgulho regional, o que, por sua vez, tornou o Athletic praticamente irredutível em seus princípios.

O Athletic foi o último clube da Primera Liga a aceitar estampar patrocínio na sua camisa, o que só aconteceu em 2008. A partir de então, deu lugar a petrolífera Petronar, obviamente de origem basca. Durante a Copa da UEFA 2005, o clube chegou a fazer propaganda do Governo Basco na camisa, com a mensagem Euskadi, que significa Pátria Basca. O primeiro negro (também descendente de bascos) a jogar pelo Bilbao foi integrado à equipe apenas em 2009. Os diretores argumentam que o clube não incentiva os grupos separatistas ou faz propaganda em favor dos mesmos, mas não se manifesta de maneira particularmente contrária quando, não raramente, propagandas de grupos extremistas aparecem em meio aos torcedores, dentro do estádio.

A representatividade do Bilbao na história do futebol espanhol é enorme. Um dos únicos três clubes a jamais terem sido rebaixados (além de Real Madrid e Barcelona), o Athletic é também um dos únicos dois clubes (o outro, o Real Madrid) a ser campeão invicto, além de ser o detentor da maior goleada da história da Liga (um 12x1 sobre o Barcelona, nos anos 30). O maior artilheiro da história do campeonato espanhol, Telmo Zarra, era do Athletic. Telmo foi o primeiro jogador a ganhar o troféu Pichichi, dado ao artilheiro da Liga espanhola. O troféu tem esse nome em homenagem a Rafael Moreno, atacante que morreu de tifo aos 29 anos, e era conhecido como "pichichi" - ele, também, jogador do Athletic Bilbao.

Nos últimos anos, muito por conta das suas auto-impostas regras, o Athletic tornou-se um clube de cantera: descobre grandes talentos que logo partem para outros clubes com maiores ambições. O conhecimento geral de todos das exigências do clube em relação a ascendência dos seus jogadores faz com que os preços destes atletas, para o Athletic, suba imensamente, fator este que pesa demais no já limitado orçamento do clube. Por estes motivos, a pressão para que o Athletic ceda ao efeito dos insucessos e acabe com sua política de contratações é grande. Alguns dirigentes acreditam que este é um desfecho inevitável se o clube quiser, algum dia, voltar a mirar voos mais altos. Mas o presidente garante que prefere ver o Athletic Bilbao rebaixado a ter de aceitar jogadores "estrangeiros" no seu clube.

Dois jogadores do Bilbao estavam entre os campeões mundiais em 2010: Javi Martinez e Fernando Llorente (ambos já nas listas de pretensões de vários clubes pela Europa, o que sugere que provavelmente não irão durar muito tempo no País Basco). A conquista espanhola representou muito mais do que o fim da fila para uma seleção acostumada a nadar, nadar, nadar e morrer na praia. A Copa do Mundo levou aos espanhóis um sentimento de unidade e pertencimento que há muito tempo o país não via. A repercussão disso, claro, chegou até o Bilbao, que passou a considerar com mais atenção a imposição da sua regra.

Para alguns, romantismo irresoluto; para outros, apenas orgulho teimoso. O fato é que nestes tempos de futebol globalizado, a situação de clubes como o Athletic Bilbao torna-se ainda mais interessante. A pergunta que fica, porém, é até quando o Athletic Bilbao vai conseguir se manter firme, sobrevivendo na base do princípio, nadando contra a corrente?
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Já que estamos nesse clima de eleição...


Nesse clima de eleição (que GRAÇAS A DEUS ACABOU), resolvi atualizar o blog. O post, originalmente, era imparcial, analisando a lista de indicados à melhor do mundo pela FIFA. Mas resolvi fazer um POST-CAMPANHA. Eu adoro o Forlán; acho que o Sneijder e o Robben fizeram uma temporada incrível; o Iniesta é um monstro mesmo tão pequenino; o Özil e o Müller são nomes que com certeza vão brilhar muito ainda; o Schweinsteiger e o Xabi Alonso são jogadores de fina categoria, que não aparecem todo dia. MAS eu tenho meu preferido e ESPERO QUE ELE VENÇA MESMO.

O Xavi é um dos melhores jogadores do mundo. Todo mundo sabe (ou deveria saber) isso. Como eu falei no Futebol e Mulher, ele tá ai, na labuta, fazendo o dele da melhor forma possível: é titular incontestável da atual campeã mundial e de um dos maiores clubes do mundo. Tem um currículo invejável. Mas teve o “azar” de estar no mesmo time que o Messi que, além de jogar tudo e mais um pouco, tem um mundo de publicidade atrás dele. Pro argentino fazer aquelas jogadas dele, os gols, ele precisa do Xavi e do Iniesta no meio-campo. Com 30 anos, o Xavi ainda tem aquele jeito de garotão, mas começa a sentir o peso do tempo. O tendão de Aquiles começa a reclamar de todos os jogos em que foi titular no Barcelona, a falta de pré-temporada por conta da Copa do Mundo e o ritmo pesado do Mundial. Mas o futebol tá lá.

Como eu falei no Futebol e Mulher [2], eu acho que o prêmio de Melhor do Mundo da FIFA tem que ir pro monstro de 1,70m chamado Xavi Hernandez. Em um ano onde nenhum jogador foi acima da média (seja em seu clube ou na seleção), nada mais justo do que premiar pelo conjunto da obra. E se tem alguém com uma obra e tanto é o Xavi. 1 Copa do Mundo, 1 EuroCopa, 5 títulos do Espanhol, 2 Champions League, 3 Supercopa da Espanha, 1 Copa do Rei, 1 UEFA SuperCup e 1 Mundial de Clubes da FIFA tá bom pra vocês?!



“O menino Xavi ficava parado no meio de campo e os adultos estranhavam esse comportamento. Certo dia seu pai lhe perguntou:

- Filho, porque você está aí parado e não vai ao ataque como os outros meninos?’

Xavi, com 5 anos de idade, respondeu:

- Porque se eu não estiver aqui, a bola não chega até lá’.”
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